Uma Noite com Pat Metheny: Música para Sonhar Acordado

18 jun

Namoro a música de Pat Metheny há mais de 15 anos e poder assisti-lo em carne e osso no Dia dos Namorados é prêmio. A noite foi em Salvador, num Teatro Castro Alves abarrotado e de som impecável. Já havia passado longa Imagemnoitada com o guitarrista em 2002, em show da mega-celebrada turnê Speaking of Now. Aquele continua sendo o mais impressionante espetáculo jazzístico que já vi. O segundo foi em Salvador, semana passada.

A tradicional cabeleira ainda está lá – mas uma tintura castanha escondeu a grisalheira de quem está às portas dos 60 -, ornamentando um dos cérebros mais geniais da música contemporânea. Como guitarrista, Pat tem sido o músico mais influente das últimas três décadas. Isso nem se discute. E os 20 Grammys e outros montes de prêmios que lhe deram eu menciono apenas de lambuja! Como logo adiante neste Blog temos texto qualificado do guitarrista e compositor Saulo Ferreira, com quem fui louvar Pat e sua patota, ficarei apenas em alguns elementos gerais.

O primeiro elemento que merece sempre lembrança é o papel central de Metheny na oxigenação do Jazz num período de baixa criatividade e forte predomínio de uma música pop algo duvidosa em termos estéticos entre o final dos anos 1970 e toda década de 1980. Ele acabou de fato antecipando o que seria a virada do Jazz, conhecida com a geração norte-americana chamada de Jovens Leões (Young Lions), Wynton Marsalis à frente da turma. Pat rodava em faixa própria com o pianista Lyle Mays ao fazer um som diferente que unia inicialmente Jazz, folk e rock. Um som intenso, mas tranquilo. Sempre bom para viajar na estrada e nas ideias. Mas quem viajou rápido mesmo foi sua própria música, desbravando fronteiras de todos os lados possíveis e ganhando contornos complexos.

Após um período no Rio de Janeiro, incorporou elementos da música brasileira com aberta e sabida influência do mineiro Toninho Horta. Note-se que o tema mais famoso de Pat, oferecido como bis em Salvador, é justamente uma bossa – Are You Going With Me? Por outro lado, Manoel, o Audaz, de Toninho, aparece claramente como inspiração em outro clássico, Last Train Home. Ainda mencionaria Insensatez, de Tom Jobim, música presente em quase todos seus shows, e colaboração marcante em trabalhos importantes de Milton Nascimento. Mas para além do Brasil, Pat estendeu as orelhas também para a Argentina, Índia, norte e centro da Europa, Espanha e África, sem deixar de cavar sempre mais fundo no solo fértil de sua pátria.

Isso significou levar muito longe a ideia de fusão cultural na música, o famoso crossover. E está evidente na volumosa obra de Pat Metheny a crença de que se a Música é universal, tudo pode ser incorporado. É claro que por algum tempo críticas pairaram sobre aquela cabeleira de roqueiro, com acusações de pasteurização e excesso de elementos pop. O homem calou todo mundo em pouco tempo. De quebra, atraiu uma gama enorme de novos ouvidos para o mundo do Jazz e da música instrumental, recolocou o gênero nas rádios e passou a se apresentar para públicos fidelíssimos e muito grandes, feito que praticamente mais nenhum jazzista era então capaz de fazer, à exceção do já enferrujado mito Miles Davis, falecido em 1991.

Metheny armou com Lyle Mays (anotem bem esse nome) provavelmente a dupla mais fiel e interessante do Jazz desde Duke Ellington e Billy Strayhorn. Isto daria assunto para tratados. Ao lado do também cabeludo, magro e alto Lyle, verdadeiro monstro em melodias, capaz de solos com doses astronômicas de lirismo e admirador assumido de Tom Jobim, fez diversas configurações, com destaque ao Pat Metheny Group (PMG), quase sempre incorporando um membro-chave de fora dos Estados Unidos. E de onde vinha o primeiro a ser encaixado? Bingo! Naná Vasconcelos integra o sensacional álbum As Falls Wichita, So Falls Wichita Falls (1981), colocando em temas cada vez mais ricos e sugestivos o que seria uma marca do trabalho de Metheny, os vocais. Para ilustrar esse tipo de registro, vou sugerir apenas quatro temas de quatro álbuns que merecem ser escutados assim que possível, tanto em áudio normal quanto em vídeos do Youtube: First Circle, Minuano (Six/Eight), Follow Me e You.

Voltando a Salvador. Pat não estava no Brasil com o PMG. Mas trouxe uma trinca de arrebentar e com a qual girou o mundo na turnê do álbum Pat Metheny Unity Band, encerrada justamente na capital baiana. Trata-se de um timaço formado pelo baterista mais desejado de sua geração, António Sanchez, pelo saxofonista top de linha (mais flauta e clarone) Chris Potter e pelo contrabaixista Ben Williams, rapaziada pelo menos 20 anos mais nova do que o líder. Estava tudo lá. Aquele som que te embarca e faz sonhar.

Sem comentários sobre o show. Como já falei demais, convido a todos para apreciar o belo texto de Saulinho Ferreira aqui adiante.

PS: Oba, consegui escrever um texto sobre Pat Metheny sem usar a palavra virtuoso!!! Putz…

Ernesto Seidl é produtor e apresentador do Programa Clube do Jazz, da Aperipê FM, Aracaju.

2 Respostas to “Uma Noite com Pat Metheny: Música para Sonhar Acordado”

  1. Andrea Goes junho 19, 2013 às 3:56 pm #

    Não sou muito racional no que diz respeito a músicos (por que não dizer?) virtuosos, nem sei discorrer intelectualmente sobre os sons que ouço e os sentimentos que eles me provocam, mas posso garantir que pessoas simples, como eu, deliram com a ousadia do som pulsante do Pat Metheny porque ele representa o que somos hoje em dia: A soma do que valorizamos, do que curtimos, do que cremos belo. Não existem mais fronteiras.

  2. jonas outubro 22, 2013 às 12:48 pm #

    Como seguidor de há muitos anos da musica do Pat Metheny, apenas tenho a dizer, que o texto está genial e mostra uma outra face de influencias na musica do PMG que muita gente desconhece…
    E sendo eu membro de uma banda que presta tributo a este grande musico que é o Pat Metheny foi com agrado que encontrei este texto
    https://www.facebook.com/PatMethenyTribute

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